terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Cimentados


Assim, devagar
Sem pressas
Foram sendo cimentados
Os livros
A vida
As sombras
O tempo

O cimento eterno
Que nos une e empareda
Nos bloqueia e estrutura
Nos obriga e nos protege
Sem explicação
Sem permissão
Tanta ilusão

Sim o mesmo
O mesmo que nos cola
Que nos cola às letras
Que nos cola às linhas
À beleza
Aos amigos
O mesmo

Essa areia subtil
Que nos tolda o olhar
Os sentidos
Que tudo engole e transforma
Que tudo molda e reduz
Que nos consome
Essa areia

Colecionamos
Catalogamos
Exibimos
Os livros
As pessoas
Os sentimentos
Tudo

Na esperança
Na infinita esperança
De nos entendermos
De não nos perdermos
Nas linhas
Nas folhas
Nas capas

Chegamos a acreditar
Acreditamos
Por vezes
Muitas vezes
Que somos o milagre
No milagre
Na imortalidade

Se não ...
Pelo menos
Na água
Sim, ela sim
Vai redimir-nos
Perdoar-nos
Lavar-nos

Esquecendo
Esquecendo a ganância
O ódio
A mesquinhês
A arrogância
A traição
O que não queremos ver

O que não queremos ser
Esta areia
Esta água
Esta cola
Que nos cimenta ao papel
E que nos deixa
Viver

António Barra - TZ

Escrevi, inspirado no livro "A Casa de Papel" de Carlos María Domínguez